Por que estamos falhando nas metas de saúde — e o que fazer a respeito
- Equipe Ênio Panetti

- 14 de jun.
- 5 min de leitura

Durante décadas, a medicina preventiva tem repetido um mantra claro: é preciso controlar a pressão arterial, reduzir o colesterol, equilibrar os níveis de lipídios, perder peso e se manter fisicamente ativo. Essas metas, consagradas por diretrizes nacionais e internacionais, são pilares na luta contra doenças cardiovasculares, diabetes e outras condições crônicas que silenciosamente roubam anos de vida saudável da população. Mas, apesar de todos os avanços científicos, da abundância de informações e do acesso crescente a tratamentos eficazes, os resultados na prática têm sido frustrantes. As metas continuam, em grande parte, não sendo atingidas. E isso não é apenas um dado estatístico — é um retrato real da nossa relação com a saúde.
A importância das metas de saúde na prática
A pressão arterial é um exemplo: deveria estar idealmente abaixo de 130 por 80 mmHg para a maioria dos adultos, especialmente aqueles com fatores de risco. No entanto, a cada ano, milhões de pessoas convivem com hipertensão descontrolada, muitas vezes sem saber. O problema não é só a falta de diagnóstico: mesmo quando a hipertensão é conhecida, a adesão ao tratamento costuma ser baixa. Medicamentos são esquecidos, retornos médicos são adiados, ajustes de dose são negligenciados. O sal continua sendo consumido em excesso, o estresse permanece crônico e o sono, insuficiente. O controle da pressão não depende só de comprimidos — exige mudança de estilo de vida, disciplina e acompanhamento regular. E é justamente aí que as falhas mais acontecem.
O cenário do colesterol e dos lipídios não é diferente. As diretrizes recomendam níveis cada vez mais rigorosos para o LDL, especialmente em pessoas com risco cardiovascular aumentado. Em alguns casos, o alvo deve ser menor que 70 mg/dL. Mas a realidade clínica é outra. Muitos pacientes sequer fazem o exame de perfil lipídico com a frequência recomendada. Outros ignoram os resultados por não sentirem sintomas — afinal, o colesterol alto é assintomático, o que contribui para a falsa sensação de que não há urgência em tratar. Quando o tratamento é proposto, o medo injustificado das estatinas, os efeitos colaterais reais ou imaginários e a desinformação muitas vezes impedem que a medicação seja iniciada ou mantida. Paralelamente, os hábitos alimentares seguem ricos em gordura saturada, ultraprocessados e refeições rápidas, sem espaço para o equilíbrio e o cuidado diário.
No que diz respeito ao peso corporal, a meta também parece estar cada vez mais distante. A prevalência de sobrepeso e obesidade só cresce, inclusive entre crianças e adolescentes. O excesso de peso é uma das variáveis mais visíveis e tangíveis da saúde — é algo que o paciente percebe no espelho, sente nas roupas, reconhece ao subir uma escada. Ainda assim, perder peso de forma consistente continua sendo um enorme desafio. Não se trata apenas de força de vontade, como muitos pensam. A obesidade é uma condição complexa, multifatorial, influenciada por genética, ambiente, emoções, sono, hormônios e cultura alimentar. Dietas radicais vêm e vão, promessas milagrosas se multiplicam, mas a manutenção do peso saudável exige constância, orientação adequada e um sistema de apoio que vá além da balança.
A atividade física é outro ponto crítico. Todos sabemos da importância de se movimentar — os benefícios são amplamente divulgados e cientificamente comprovados. Bastaria caminhar trinta minutos por dia, cinco vezes por semana, para colher ganhos significativos em saúde cardiovascular, metabolismo, humor e sono. Ainda assim, a inatividade física permanece como uma das principais causas de doenças evitáveis. A rotina atribulada, o sedentarismo associado ao trabalho em frente às telas, o cansaço mental e a falta de espaços adequados em muitas cidades criam um ambiente onde mover o corpo parece um luxo, não uma necessidade.
Mas, afinal, por que as pessoas não atingem suas metas de saúde?
O que une todos esses fracassos? Em parte, um sistema de saúde que ainda é reativo, centrado na doença e não na prevenção. Muitas vezes, a primeira abordagem ao paciente é feita apenas quando já existem sintomas ou complicações — infarto, AVC, diabetes descompensado, insuficiência cardíaca. Faltam políticas públicas mais eficazes, campanhas educativas constantes, incentivos à alimentação saudável e ambientes urbanos que favoreçam o movimento. Mas também há, do lado individual, uma desconexão profunda entre o saber e o fazer. Saber o que é saudável não garante a prática. A mudança de comportamento é um processo lento, emocional e cheio de obstáculos invisíveis.
Além disso, o imediatismo cultural colabora com essa desconexão. Espera-se resultados rápidos — perder peso em uma semana, controlar o colesterol com um único suplemento, baixar a pressão só com um chá milagroso. Mas a saúde é construída em ritmo de constância, não de urgência. Os efeitos protetores vêm com o tempo, e os prejuízos de hábitos ruins se acumulam silenciosamente até se tornarem visíveis. A dificuldade de manter o foco a longo prazo é compreensível, mas precisa ser enfrentada com estratégias realistas, acompanhamento profissional e, sobretudo, paciência.
Um ponto que merece destaque é a individualização do cuidado. Não basta recomendar a mesma meta para todos. Cada pessoa tem sua história, suas crenças, suas limitações e seus medos. Uma abordagem empática, que escute, compreenda e se adapte à realidade do paciente, é muito mais eficaz do que uma lista genérica de metas. A motivação surge quando o paciente se sente acolhido, quando percebe que há um plano que faz sentido para sua vida, e não apenas para os números do laboratório.
A tecnologia pode ser uma grande aliada nessa jornada. Aplicativos de saúde, telemedicina, dispositivos de monitoramento, lembretes inteligentes, grupos de apoio online — tudo isso pode ajudar a manter o paciente engajado e informado. Mas tecnologia sozinha não resolve. É preciso humanização, vínculo e presença. O contato frequente com o profissional de saúde, seja o médico, nutricionista, educador físico ou psicólogo, cria uma rede de sustentação que favorece a continuidade do cuidado.
Também não podemos ignorar os determinantes sociais da saúde. Fatores como renda, escolaridade, acesso ao transporte, moradia adequada e segurança alimentar impactam diretamente na capacidade de alguém atingir metas de saúde. Um paciente que precisa escolher entre pagar o aluguel e comprar um medicamento para colesterol dificilmente conseguirá seguir a recomendação médica, por mais bem-intencionada que ela seja.
Políticas públicas que garantam o mínimo necessário para uma vida digna são parte essencial da equação da saúde.
Então, diante de tantas metas não atingidas, a resposta não deve ser culpa ou desistência. Deve ser reflexão, ajuste e persistência. Precisamos parar de tratar saúde como um projeto pontual e começar a enxergá-la como um compromisso contínuo. As metas precisam ser realistas, personalizadas e acompanhadas de perto. E o mais importante: não basta esperar que o paciente mude sozinho. É necessário oferecer suporte, orientação clara e ferramentas práticas.
Quando uma pessoa consegue controlar a pressão, equilibrar o colesterol, atingir um peso saudável e adotar uma rotina ativa, os ganhos não são apenas estatísticos. São anos a mais de vida com qualidade, menos internações, menos medicamentos, mais disposição, autoestima e bem-estar. Esses resultados valem o esforço — e, mais do que isso, valem uma nova abordagem, mais humana, mais prática e mais conectada com a realidade de quem está tentando, todos os dias, ser mais saudável.
Ênio Panetti - CRM 52.56781-1
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